João Cândido na Praça XV-RJ - acervo Biblioteca Nacional |
O mês de novembro está em vias de
reafirmação enquanto mês da consciência negra. Com a inscrição do marinheiro
João Cândido Felisberto no Livro dos Heróis e Heroínas do Estado do Rio de
Janeiro, podemos agora celebrar oficialmente mais um herói negro. Através da Lei
nº 8623, de 18 de novembro de 2019, João Cândido é assumido publicamente e de
forma irrefutável, como figura fundamental para que os castigos físicos nos
navios da Marinha do Brasil tivessem um fim definitivo.
Se dependesse da opinião pública
e da imprensa naquele dia 22 de novembro 1910, a chamada Revolta da Chibata
passaria batida em meio a conturbada conjuntura social e política do início de
Século XX. Devemos lembrar que o Rio de Janeiro já vinha sendo sacudida por
manifestações populares causadas pelo “bota a baixo”, como foi apelidada a estratégia
de derrubada de cortiços e remoções em massa, promovidas por Pereira Passos
durante sua gestão (1902-1906) que se prolongou até 1910. Nesse mesmo período
ocorria a “revolta da vacina” (10 a 16 de novembro de 1904),
quando as pessoas eram obrigadas a se vacinar, inclusive com o direito de ter
suas casas invadidas pela polícia. Os constantes rumores e manifestações
políticas então contribuíram significativamente para que a população compreendesse
claramente o que significava tal levante, considerando também que a Marinha
mantinha completo silencio sobre o fato, de modo a evitar repercussão pública.
Marujada no Navio Minas Gerais, já dominado - Acervo Biblioteca Nacional |
Frei Tatá, Jorge Florêncio e Adalberto Cantinho, filho de João Cândido em audiência pública no MPF/Meriti |
Há uma virtude importante na
promulgação da Lei Nº 5808, de 25 de agosto de 2010, que cria o Livro de Heróis
Fluminenses. Se considerarmos o peso que a história oficial carrega,
estabelecendo o perfil dos vultos históricos exaltados desde sempre em nosso
país, entenderemos que essa forma de registro pode se tornar um importante
espaço de reparação e estabelecimento de um mecanismo de resguardo da memória
de figuras verdadeiramente dignas de nota. Os critérios para escolha de nomes estabelecidos
na lei são de igual modo importantes. O primeiro critério que considero fundamental
é o que estabelece o número mínimo de 1/3 dos votos em plenário, para aprovação
dos projetos apresentados, sendo que o homenageado deve ter pelo menos 50 anos
de falecido ou desaparecido para que seu nome seja apreciado em plenário. Outro
fator que considero importante é que o projeto de inserção de nome ao livro não
deve tramitar em regime de urgência, o que configuraria impeditivo ao debate
amplo e público em relação a figura a ser contemplada.
Por fim, em um momento no qual as
estruturas democráticas veem sendo abaladas, com claros indícios de
desmoronamento iminente, torna-se urgente e extremamente relevante estabelecer
mecanismos de resguardo da memória de heróis e heroínas nacionais com os quais a
população possa se espelhar.