Não podemos acreditar que foi necessária uma pandemia para que pudéssemos retomar ponderações quanto a gestão local de políticas culturais, que remontam o uma época onde encontros como o Café Filosófico e o Cidade e Cultura, mobilizavam a classe artística, buscando atender demandas pulsantes no município de Mesquita. Retomar então o debate a partir do Movimento PróCultura Mesquita, criado em 2009 com o objetivo de manter aberto um espaço não governamental de debates, é buscar o retorno do diálogo entre sociedade civil e governo. No que se refere ao estabelecimento de marcos legais como o Sistema Municipal de Cultura e uma Lei de Fomento e Incentivo, o objetivo aqui é compreende a emergente e fundamental importância do estabelecimento do Fundo Municipal de Cultura. Para que tenhamos clareza de quão relevante é a questão, esboçamos aqui o contexto no qual a Lei Aldir Blanc deveria tranquilamente se enquadrar, nesse momento de emergência financeira dessa tão importante categoria de trabalhadores.
A Constituição Brasileira, que vigora desde
1988, é considerada por instituições e governos internacionais como uma das
mais avançadas do mundo, no que se refere ao acesso a direitos por parte dos
cidadãos, o que lhe atribuiu o título de “Constituição Cidadã”, dentro e fora
do Brasil. Um dos aspectos que lhe trouxe esse rótulo foi a adoção dos
mecanismos de controle social como modelo de gestão participativa, além da
garantia de acesso e interferência no leque de prioridades dos governos, nas
três esferas de poder. Outro fator relevante inserido em nossa Carta Magna é o
princípio da descentralização dos recursos, cabendo ao governo federal a
formulação das macro políticas, direcionando proporcionalmente recursos
financeiros para estados e municípios. Tais recursos, porém, são geridos
localmente através dos fundos setoriais, mecanismos que têm como premissa
atender com agilidade e foco a demandas e prioridades da sociedade civil.
Em
que contexto está o Fundo de Cultura?
Tomemos ainda como exemplo o que ocorre na
esfera federal, onde o Fundo é parte integrante do que costumamos chamar de CPF
da Cultura (Conselho, Plano e Fundo), no contexto do Sistema Nacional de
Cultura-SNC. Em 2012 o SNC foi inserido na Constituição Brasileira através de Emenda Constitucional, no Art. 216-A.
cabe observar que as discussões nessa direção já ocorriam em 2005, quando se
deu a 1ª Conferência Nacional de Cultura, em Brasília. A proposta então é que
esse mecanismo garanta respectivamente transparência e acompanhamento das
políticas setoriais de cultura através do Conselho Nacional de Cultura-CNC,
Definição das linhas de ações e metas através do Plano Nacional de Cultura-PNC
e acesso a recursos voltados prioritariamente ao protagonismo de agentes
culturais na sociedade civil, através do Fundo Nacional de Cultura-FNC. De
igual modo, em 2015 foi sancionada no Estado do Rio de Janeiro a Lei 7035/15
que estabelece o Sistema estadual de Cultura-SEC. Nos mesmos moldes que a
política nacional, ficou então garantido que nosso estado fluminense também
definiria de forma clara e participativa um conjunto de propostas que
possibilitem o protagonismo regional tanto da gestão pública municipal quanto
de agentes culturais, artistas e produtores. Nesse sentido foi lançado em junho
deste ano o primeiro edital regionalizado do Fundo Estadual de Cultura,
atendendo a 1800 artistas nos 92 municípios do estado, tendo mais de 6.000
proponentes acessando o Edital “Cultura Presente nas Redes”. Na esfera
municipal podemos tomar como referência os fundos municipais de Caxias criando
em 2005 e Nova Iguaçu, esse último criado em janeiro de 2007, ambos com
regulamentação e editais já lançados e executados. É possível então compreender
que tais mecanismos são amplamente viáveis e eficientes. O que ocorre é que o
Orçamento Municipal é apenas uma das possíveis fontes de recursos, financeiros.
Devemos assim considerar que o aporte de recursos do fundo pode surgir do
percentual sobre o uso de uso dos espaços públicos, doações de entidades diversas,
saldo de projetos culturais, saldos de orçamentos vencidos e, principalmente,
dos repasses fundo a fundo, oriundos dos Fundos Nacional e Estadual de Cultura.
Vale aqui acrescentar que o Conselho Municipal de Cultura de D. Caxias foi
criado em 1974, através da Lei nº 1.948/74
e que Nova Iguaçu, ainda que muito mais recente em relação a seu CPF, já lançou
dois editais públicos em 2007 e 2010.
Ainda
que a gestão do Fundo Municipal de Cultura-FMC deva por lei ser vinculado à
Secretaria Municipal de Cultura, há uma série de dispositivos que garantem sua
transparência tanto na gestão de seus recursos quanto na divulgação,
acompanhamento e execução de seus editais públicos. O acompanhamento das ações
do FMC é feito por um Comitê Gestor eleito dentro do Conselho de Cultura, com
publicação de seus nomes em Diário Oficial com nomeação não remunerada de suas
funções. As transferências de recursos do FMC devem priorizar ações como acesso
a bens culturais, formação de agentes culturais, preservação de patrimônio material
ou imaterial, fomento a pesquisa e inovação, premiar ações relevantes à cultura
local, promover acesso à bens culturais, entre outros.
A principal virtude do FMC é então a de
garantir recursos financeiros para que agentes culturais, mestres e produtores
possam preservar o patrimônio cultural local e fomentar ações na base da
sociedade, no que diga respeito a sua produção cultural. Tais ações, seja elas
de vanguarda ou tradicionais, sempre carecem de constante atualização do
cadastro municipal de agentes culturais. Ou seja, para a eficiente ação do CPF
da cultura, é necessário um claro e prévio diagnóstico do cenário cultural do
município, de modo que as políticas previstas no PNC, analisadas pelo Conselho
de Cultura, atendam de forma fidedigna tanto às demandas da classe artística
quando a necessidade de preservação de nosso patrimônio histórico. Podemos
somar a isso a constante necessidade de formação, capacitação e reciclagem de
agentes culturais e gestores, nos municípios, demanda constante que tem com
fonte de recursos fundamentais o FMC.
FMC
como legado para Mesquita
Uma das principais queixas que surgiram após
as Olimpíadas de 2016 tem haver com o chamado “Legado Olímpico”, no sentido que
os investimentos em estádios e demais arenas de jogos deveriam servir às
gerações futuras, o que de fato não ocorreu. Citei de início que em nossa
Região apenas Duque de Caixas e Nova Iguaçu destinaram recursos financeiros e
executaram editais de seus respectivos Fundos de Cultura. Observemos então a
atual conjuntura, na qual a pandemia do Novo Coronavirus impõe restrições aos
espaços de produção cultural, horizontalizando a crise financeira em toda
cadeia produtiva da cultura no Brasil. A partir desse olhar entendemos que é
fundamental deixar um legado para as gerações futuras e não apenas atender a
uma demanda emergente da classe artística, no sentido que políticas
estruturantes permitam que eventuais ações emergenciais não lancem na arena um
grande número de artistas de renda reduzida, no total ostracismo. No que se
refere também a seus recursos financeiros, bem como as instituições as quais esses
artistas representam, essa pandemia nos leva a refletir sobre a importância de
um Fundo Municipal de Cultura instituído, de modo a garantir aos agentes
culturais mesquitenses o mínimo de dignidade nesse momento. E no que tange as
perspectivas futuras, que editais claros e democráticos possibilitem à nossa
gente o devido acesso a recursos para fruição de seus projetos. O que se dará
sempre quando o poder público veja e seja visto como parceiro, considerando que
o pensamento da classe artística estará bem representado em um Conselho
Municipal de Cultura que entenda a ideia de que governos passam mas, que
políticas estruturantes permanecem.
FÓRUM
PRÓCULTURA MESQUITA DE POLÍTICAS CULTURAIS
Muito obrigado pelo desabafo e compartilhamento de informações tão importantes. Espero que Mesquita assim como Nilópolis possam ter o sei tão desejado FMC. Abs
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